sou? Minha principal produção é a série “desmistificando”. Nela, apresento análises detalhadas e científicas a respeito de temas (92 no momento) rodeados por algum tipo de misticismo na internet e fora dela. Dentre eles: ▪ Teorias da conspiração; ▪ Hipóteses pseudocientíficas; ▪ Pseudociências; ▪ Eventos alegadamente sobrenaturais; ▪ Mídias e artefatos perdidos ou amaldiçoadas; ▪ Sites misteriosos; ▪ Materiais e personagens virais; ▪ Crimes alegadamente reais, ou com alegações sobrenaturais; ▪ Projetos reais com desdobramentos pouco entendidos. ▪ Contos de terror alegadamente reais.
é importante? Vivemos na era da informação. Obter informação nunca foi tão fácil, bem como produzi-la e publicá-la. Qualquer pessoa com acesso à internet é capaz de iniciar um canal (de qualquer natureza) e postar informações nele. E qualquer outra pessoa é capaz de acessá-lo. Canais na internet – assim como livros, jornais ou revistas – aceitam qualquer tipo de informação. Porém, a realidade é uma só. Logo, parte das informações presentes na internet (e fora dela) podem não corresponder à realidade. E isso de fato acontece. E pessoas frequentemente levam a sério informações desse tipo. Por essa razão, nós temos um problema.
esse problema? Várias soluções já foram propostas. Agências de checagem constituem uma delas, e são muito populares. Agências de checagem recebem notícias, produzem uma análise e fornecem um veredito a respeito dessa notícia. Porém, muitos se perguntam se poderíamos confiar no trabalho dessas agências. Outros afirmam que todas as agências são compradas e que, por isso, nós não podemos confiar nelas. Nessa palestra, apresentarei alguns fundamentos que norteiam meu trabalho e que permitem que qualquer um verifique não só notícias, como também publicações de agências de checagem e de qualquer outra instituição. Não há nada de errado, pretensioso ou suspeito nisso. É assim que fazemos ciência.
essa análise? Não há uma receita para verificar todo tipo de publicação ou conceito. Mas existem alguns princípios que podem ser aplicados, bem como ferramentas que podem ser usadas em cada um deles. Tendo escolhido um tema, eu sempre faço as seguintes perguntas: ▪ Quando esse assunto surgiu? Quem o iniciou? Onde isso ocorreu? Como isso ocorreu? ▪ Quais modificações foram sofridas ao longo do tempo? ▪ Das fontes que poderiam ter abordado esse assunto quando ele ocorreu, quais o fizeram? ▪ Quais evidências que sustentam esse ponto são apresentadas? Essas evidências são consistentes? ▪ A argumentação – em sua melhor forma – possui falácias lógicas? ▪ A argumentação e suas implicações no mundo real violam princípios conhecidos e testados? A seguir, irei mostrar alguns métodos e ferramentas que norteiam meu trabalho.
gênese de um tema O Google Trends (https://trends.google.com.br/trends/?geo=BR) permite saber o quanto um termo foi pesquisado por época, além do local. Isso é extremamente valioso.
gênese de um tema O Google Trends (https://trends.google.com.br/trends/?geo=BR) permite saber o quanto um termo foi pesquisado por época, além do local. Isso é extremamente valioso.
gênese de um tema A resolução máxima é de horas, e a combinação de vários idiomas também lhe permite deduzir em qual língua o termo surgiu primeiro. O tema surgiu em espanhol E só depois em inglês
gênese de um tema Tendo essa informação em mãos, partimos para o Google. Usamos aspas (para facilitar nosso trabalho) e filtramos uma data. O objetivo é achar a ocorrência mais antiga desse tema. Operadores lógicos (como E ou OU) também podem ajudar ao permitir várias buscas simultâneas.
gênese de um tema Uma vez que o primeiro responsável por propagar o tema foi localizado, é a hora de analisarmos como essa propagação ocorreu. Seguem alguns sinais vermelhos: ▪ O responsável por publicá-lo é um meio satírico ou de ficção; ▪ O responsável por publicá-lo é um meio conhecido por propagar teorias da conspiração; ▪ A primeira publicação sobre o tema ocorreu muito tempo depois dele ter supostamente ocorrido; E seguem alguns sinais verdes: ▪ O responsável por publicá-lo é um meio com credibilidade no assunto. ▪ A primeira publicação sobre o tema ocorreu concomitantemente a sua ocorrência, ou há uma razão para ela ter ocorrido depois.
sofridas ao longo do tempo Então – e essa parte costuma ser entediante – devemos avançar a busca por data no Google, acessando cada resultado e verificando se houveram mudanças na história. Eis alguns sinais vermelhos que põe em cheque versões posteriores: ▪ A história apresenta adições sem motivos para tal; ▪ A história apresenta mudanças contraditórias com a versão inicial; E seguem alguns sinais verdes: ▪ A história apresenta desdobramentos posteriores; ▪ A história apresenta esclarecimentos e adições de pessoas envolvidas;
indisponíveis Esse trabalho frequentemente envolve acessar links que já saíram do ar. Esse é um trabalho especialmente de sorte – depende de alguém ter arquivado no passado – mas existem ferramentas que ajudam nesse processo. São elas: ▪ Arquivos da web: http://web.archive.org/, http://archive.is/, https://timetravel.mementoweb.org e https://cachedview.com. ▪ Sites de arquivo especial: https://4plebs.org. O 4chan é bem conhecido por iniciar boatos, então arquivos desse site podem ser fundamentais. ▪ Truques: pesquisar o endereço de um vídeo do YouTube já indisponível no Twitter, para tentar obter seu título e (talvez) miniatura.
fontes Eventos reais normalmente são noticiados em várias fontes em um tempo curto (uma vez que não precisam “viralizar”, já que efetivamente ocorreram), você pode procurar por essas ocorrências. Eventos mais antigos (como ocorridos antes da internet) podem também ser procurados por data. Algumas ferramentas auxiliam nesse processo: ▪ Arquivos de jornais, como o https://www.newspapers.com e portais de notícias locais. ▪ Base de dados familiares e genealógicas, como o https://www.myheritage.com.br e https://www.myheritage.com.br. ▪ Livros, que podem ser buscados (com busca textual) no Google Livros, em https://books.google.com.br. ▪ Artigos científicos, que podem ser buscados (com busca textual) em indexadores acadêmicos, como em https://scholar.google.com.br, https://www.researchgate.net e https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov (apenas biologia e medicina).
fontes A presença de várias fontes é um bom indicador da veracidade ou não de uma notícia. Seguem alguns sinais vermelhos: ▪ Não existem outras fontes que noticiam o mesmo evento na mesma época (ou seja, relatos de primeira mão). ▪ Existem outras fontes, mas elas apenas copiam um mesmo texto. ▪ A mídia do local em que o tema teria ocorrido não o menciona ou o nega. E seguem alguns sinais verdes: ▪ Diversas fontes, em diversos meios, apresentam relatos de primeira mão do ocorrido. ▪ A mídia local menciona o tema, e apresenta mais detalhes.
Analisar evidências é um processo complexo, e as ferramentas e abordagens utilizadas dependem do tipo de evidência. Porém, apresentarei os mais comuns. Imagens e vídeos podem ter suas origens encontradas através de sites de busca reversa, como o TinEye (https://tineye.com), o Yandex (https://yandex.com/images/) e o Google (https://images.google.com). Eles são úteis para detectar fotomontagens, identificar elementos utilizados nela e descobrir a origem de uma imagem ou vídeo.
Analisar evidências é um processo complexo, e as ferramentas e abordagens utilizadas dependem do tipo de evidência. Porém, apresentarei os mais comuns. Imagens e vídeos podem ter suas origens encontradas através de sites de busca reversa, como o TinEye (https://tineye.com), o Yandex (https://yandex.com/images/) e o Google (https://images.google.com). Eles são úteis para detectar fotomontagens, identificar elementos utilizados nela e descobrir a origem de uma imagem ou vídeo.
Seguem alguns motivos para se suspeitar de uma narrativa: ▪ Ela é sustentada em uma montagem; ▪ Ela é sustentada por uma imagem ou vídeo verdadeiro, mas retirado de um contexto diferente; ▪ Ela associa imagens de diferentes contextos em um só; ▪ Ela usa imagens que, apesar de serem originais e não manipuladas, não sustentam o ponto de fato. E seguem alguns motivos que tornam uma notícia mais crível: ▪ As imagens apresentadas são originais, fidedignas e corroboram para o fato narrado.
Sites podem ser analisados por meio de consultas de whois, que indicam o responsável por trás do endereço na web. Essa consulta pode ser do presente ou retroativa. Arquivos de sites também nos indicam quais mudanças eles passaram. Ao cruzar essas informações ,podemos obter contatos para entrevistas, fazer associações ou eliminar de hipóteses.
Seguem alguns motivos para se suspeitar de uma evidência fornecia por um site: ▪ Ele pertence a uma pessoa ou organização fantasma, com dados fictícios. ▪ Ele pertence a uma pessoa ou organização conhecia por propagar desinformação. ▪ A organização ou pessoa responsável por ele não é compatível com seu conteúdo. ▪ Seu histórico não é compatível com a notícia sustentada. Seguem alguns motivos que tornam uma evidência fornecida por um site mais aceitável: ▪ Ele é transparente e pertence a uma pessoa ou organização que pode ser contatada. ▪ A pessoa ou organização responsável por ele é compatível com seu conteúdo. ▪ Seu histórico não é compatível com a notícia sustentada.
Qualquer tipo de arquivo digital pode ser analisado de forma forense por meio da busca por metadados. Metadados são informações ocultas presentes em arquivos digitais que ajudam softwares a organizá-los e processá-los. Com programas adequados (e até mesmo on-line, como o https://www.metadata2go.com), podemos ler esses metadados e levantar informações como: ▪ Localização (latitude e longitude) de uma fotografia ou vídeo; ▪ Dados do dispositivo utilizado para uma fotografia ou vídeo; ▪ Data de produção e modificação do arquivo digital; ▪ Softwares utilizados para produção do arquivo digital; ▪ Caminhos no disco rígido do dispositivo utilizado, que revelam nomes de pastas e de usuário. ▪ Outros arquivos utilizados na composição do arquivo digital.
Qualquer tipo de arquivo digital pode ser analisado de forma forense por meio da busca por metadados. Metadados são informações ocultas presentes em arquivos digitais que ajudam softwares a organizá-los e processá-los. Com programas adequados (e até mesmo on-line, como o https://www.metadata2go.com), podemos ler esses metadados e levantar informações como: ▪ Localização (latitude e longitude) de uma fotografia ou vídeo; ▪ Dados do dispositivo utilizado para uma fotografia ou vídeo; ▪ Data de produção e modificação do arquivo digital; ▪ Softwares utilizados para produção do arquivo digital; ▪ Caminhos no disco rígido do dispositivo utilizado, que revelam nomes de pastas e de usuário. ▪ Outros arquivos utilizados na composição do arquivo digital.
Seguem alguns motivos para se suspeitar de um arquivo digital: ▪ Ele foi produzido antes do evento ter ocorrido; ▪ A fotografia ou vídeo foram feitos após as evidências do evento terem deixado de existir; ▪ A fotografia ou vídeo contém nomes de softwares comumente utilizados em montagens; ▪ A fotografia ou vídeo foram feitos em um local diferente do esperado; ▪ O ele foi feito com um software que não existia na época do evento; ▪ Ele contém nomes de usuários incompatíveis com o esperado ou que delatam uma fabricação. Seguem alguns motivos que tornam um arquivo digital mais aceitável: ▪ A data de produção e local condizem com o esperado; ▪ Não existem evidências do uso de softwares utilizados em montagens; ▪ Os nomes de usuário são compatíveis com os detalhes da história.
A análise dos argumentos é tão importante quanto a análise das evidências. Ela permite apontar falhas na essência da história: sua apresentação. Primeiro, e de extrema importância: sempre analise a melhor versão possível de um argumento. Se você procura analisar uma teoria pseudocientífica, por exemplo, analise as publicações originais e não a corrente que sua tia recebeu no WhatsApp. Analisar uma versão piorada, distorcida ou simplificada do argumento constitui a falácia do espantalho, e seu objetivo é identificar falácias, não cometer uma.
Uma falácia é um raciocínio errado com aparência de verdadeiro, e notícias falsas ou hipóteses pseudocientíficas frequentemente usam falácias ao expor seus pontos. Você pode ler mais sobre o assunto em https://www.outpan.com/app/bc6e214ae3/aristotle. Um raciocínio falacioso coloca sob suspeição as implicações desse raciocínio, mas ele por si só não é suficiente nem para provar que essas implicações são falsas, ou para provar que toda a notícia ou hipótese é falsa.
“A teoria da evolução é uma mentira porque o homem jamais poderia descender dos macacos.” (falácia do espantalho) “O suplemento mineral milagroso é seguro porque um médico famoso o divulgou.” (falácia do apelo à autoridade) “Cigarros são saudáveis porque meu tio fumou por 40 anos e nunca ficou doente.” (falácia anedótica) “Nós não sabemos o que o ser humano é capaz de fazer, portanto a centopeia humana é real.” (falácia do apelo à ignorância) “Se celebridades fizessem parte de um culto de sacrifícios humanos, algumas apareceriam com o olho esquerdo roxo. Algumas celebridades apareceram com o olho esquerdo roxo, logo esse culto existe.” (falácia da única causa)
“O mundo não é um mar de rosas, portanto sacrifícios humanos para extração de adrenochrome são reais.” (falácia da falsa dicotomia) “Transgênicos são ruins porque não são naturais.” (falácia do apelo à natureza) “Apenas pessoas que querem acobertar os túneis do inferno dirão que eles jamais existiram.” (envenenando o poço) “Hillary disse que quebraremos o teto de vidro. Ela só podia estar se referindo ao domo sobre a Terra plana.” (citação fora de contexto) “Vampiros existem porque são uma crença milenar.” (apelo à tradição)
da argumentação com o mundo tal qual você conhece Nós certamente temos alguns conhecimento do mundo, que tende a ser maior nas áreas que dominamos ou nos interessamos. Você sempre pode usar seu conhecimento de mundo para contrapor narrativas, e você sempre pode expandir esse conhecimento: livros e artigos científicos são mais fáceis do que nunca de serem obtidos gratuitamente na internet. Uma narrativa que não seja compatível o conhecimento de mundo consolidado é muito provavelmente falsa e, caso não fosse, deveria ser publicada de forma científica e não no Whatsapp, em canais duvidosos ou em grupos do Facebook.